VEM POR AÍ
Uma conversa sobre filmes e mulheres
VEM POR AÍ
LANÇAMENTOS INTERESSANTES DE 2007 – Parte 3
MINHA MÃE GOSTA DE MULHERES (DVD)
Minha Mãe Gosta de Mulheres
Color - 96 minutos
Direção e roteiro: Daniela Fejerman e Inés París
Distribuição: Europa Filmes
A Europa filmes lançou na encolha (e bem atrasadinho) o DVD “Minha mãe gosta de mulher”, filme das diretoras Daniela Fejerman e Inés París, que escolheram um tom cômico para abordar um assunto pouco explorado nos filmes lés: ser mãe e homossexual. A pianista Sofia tem três filhas e apaixona-se por Eliska, que é imigrante e muito mais nova que ela. As meninas não gostam nem um pouco da idéia e reúnem forças para azedar o relacionamento da mãe. “Guerreira” típica, Sofia vai à luta para afirmar seu amor por Eliska. A história é bem leve, apesar do drama atravessado pelas personagens, e resulta em um ótimo filme para assistir com a mãe ou com os filhos. Pode passar na sessão da tarde sem traumas para a família.
LANÇAMENTOS INTERESSANTES DE 2007 – Parte 2
Já que então é natal...
ESTRANHOS NO PARAÍSO: Tempos de colégio (HQ)
LANÇAMENTOS INTERESSANTES DE 2007 - Parte 1
Já que então é natal...
FUN HOME: uma tragicomédia em família (HQ)
FUN HOME
Alison Bechdel
Conrad Editora
Preço médio: R$ 42,90
Formato: 16 x
A história gira em torno das lembranças de sua infância e adolescência, concentrando-se em sua relação familiar, em especial na figura do pai, complexa e misteriosa, cujo significado em sua vida não chega a se amarrar completamente. No centro de um grande nó estão a descoberta de sua homossexualidade e a homossexualidade não-assumida do pai, que morre em circunstâncias estranhas.
Alison é a própria narradora da história, mas este recurso tradicional é utilizado com originalidade. A narrativa não é linear, como se acompanhasse os fluxos aleatórios de lembrança. O vai-e-volta no tempo não tem rumo certo, as lembranças são repassadas, adquirem novos significados, e assim a história vai ficando bem interessante. Alison ora tenta encadear os eventos, ora apenas registra pipocos de memória. O tempo é proustiano (grande referência da história), redescoberto e nunca apenas resgatado. Ou, como disseram os gregos (outra gande referência), “não é possível banhar-se duas vezes no mesmo rio”. Quem lembra de um conto, aumenta um ponto. E alison o fez de modo muito inspirado, com toda sua vocação artística. Sorte dos leitores.
Meu reencontro com Marina Lima aconteceu em um desses passeios por lojas de discos, quando vi o “Todas ao vivo” dando sopa na prateleira de CD’s. “Há quanto tempo”, saudei em silêncio, pensando no meu vinil já aposentado – mas que quase virou pó, de tanto que andei com ele pra cima e pra baixo nos anos 80.
Eu pisei no Canecão/RJ em 1986 para ver o show deste disco e fui brindada com uma apresentação sem igual, habitante definitiva da minha memória afetiva. Eu não pude entender naquele momento o que acontecia, mas ela fazia um movimento dentro da MPB em uma direção singular e arriscada, que foi emocionante testemunhar. Não havia nada parecido no cenário da MPB, nada que combinasse música e atitude da forma como ela o fez. Por isso ela se tornou tão especial para mim naquele momento.
Vinte anos remaram, eu fui ouvir um monte de outras coisas, ela lançou outros discos, recolheu-se por um tempo e voltou à cena recentemente. Fui matar saudades, no maior tom de nostalgia, com um show que rolou em um lugar muito bacana aqui no Rio, o Parque dos Patins, na Lagoa.
E como gostei do que vi. A nostalgia cedeu, música a música, ao prazer do estranhamento com as novas canções e, especialmente, com as novas leituras de hits das antigas, bebendo nas fontes dos sons eletrônicos. Este tom lhe cai tão bem que, suspeito, nunca lhe foi totalmente estranho. “$ Cara”, por exemplo, parece ter sido escrita para esta roupagem.
Elos entre MPB e música eletrônica já andam sendo feito por aí há bastante tempo, é verdade, mas a riqueza da música brasileira e as possibilidades de criação abertas por esta sonoridade podem dar em algo bem diferente. Foi o que imaginei, ao vê-la experimentando e se arriscando de novo, tentando deixar mais uma vez o conforto da condição de cantora de MPB e, mais importante ainda, evitando viver do passado. Aliás, nem posso dizer que “revi” o passado neste show. Ouvindo “Nervos de aço”, sob o céu da Lagoa, mas como se estivesse em Bristol, só pensei no que poderia estar por vir. Sorri, pressentindo a emoção do risco. Que assim seja, ...
BEM-ME-QUER-MAL-ME-QUER
Invente uma porta
Chame um táxi
Ou vá rolando
Só volte se ouvir
Eu discursar em desatino
(e com a boca toda torta)
Só pra garantir,
Tome a escova de dentes
E leve os filmes do Fellini
Não se preocupe, a gente se vê
Quem sabe no Fla-Flu
(Em frente à estátua do Bellini)
Se me descontar a mesquinhez
Eu posso te dar um conselho
Se doer
Funciona, eu garanto
feche os olhos e cante
(“O sol há de brilhar mais uma vez...”)
Mas se apresse, ande, se adiante
Antes que a imagem me alcance
Você, linda, rodopia
Se entregando a braços outros
Desconjuro!
(É pior que endoscopia)
Por Zelig, Novembro 2007.
FESTIVAL MIX BRASIL
Em Novembro começa o 15◦ Festival Mix Brasil de Cinema e Vídeo da Diversidade Sexual, que ocorre
LONGAS:
(Saskia Heyden, 2007, Alemanha,
(Marco Simon Puccioni, 2007, França/Itália,
(Lisa Gornick, 2006, Reino Unido,
(Glenn Gaylord, 2007, EUA,
(Coletivo, 2007, Alemanha,
(André Schäfer, 2007, Alemanha,
(Parvez Sharma, 2007, EUA,
(Céline Sciamma, 2007, França,
(Amir Jaffer, 2007, EUA,
(Sebastian Cordoba, 2007, EUA,
(Jamie Babbit, 2007, EUA,
(Zero Chou, 2007, Taiwan,
(Lucía Puenzo, 2007, Argentina,
Abrigo, Cantiga do Tic-Toc, Incrível história do cinema gay, Lírios D'água, Jihad de amor e XXY, que passaram no Festival do Rio, estão resenhados nos arquivos de Outubro e Setembro deste blog.
MOSTRA CURTAS MIX BRASIL:
No Rio de Janeiro, o Festival ocorre de 29 de Novembro a 06 de Dezembro.
Estrela por 30 anos. Rainha dos olhos pretos. Siouxsie Sioux está na praça, com Mantaray, fazendo mais uma vez a diferença. Desde o final dos anos 70 dando o seu recado ao lado dos Banshees, manda, e muito bem, o primeiro solo de sua carreira. Amantes do punk, do gótico e do cabaré agradecem.
TIPOLOGIAS
Foi um dia de choro, mágoas e, ainda por cima, estou com a porra da vagina doída.
Eu nem imaginava que ia ser essa dureza toda o dia de hoje. Apesar de que, na semana passada, quando marquei a consulta com o ginecologista, desisti na sala de espera, porque o médico estava muito atrasado. Aquela coisa de direitos do consumidor e tal.
Desta vez aguardei, apesar da demora. Junto com a consulta médica, ganhei uma inesperada sessão de terapia. O doutor é um sujeito simpaticão, gente boa mesmo e acredita sinceramente que é cheio de habilidades com o lado humano. Fácil, fácil reconhecer as técnicas que parecem ter saído de uma péssima leitura de livros de psicanálise. Jogou uns dois ou três papos para “descontrair” enquanto fazia minha ficha, elogiou quando eu respondi que era professora de sociologia e arrematou o assunto com uma série de auto-elogios sobre ser um médico muito “sensível”. Também mandei umas duas ou três letras tentando sugerir que estava consciente da necessidade do exame e que eu não me sentia ameçada por ele. Mas não adiantou. Acho que ele já está ligado no automático há muito tempo e repete as mesmas tiradas com todas as mulheres. Quer dizer, ao menos com as mulheres lésbicas.
Ele não perguntou nada sobre minha vida sexual e eu achei estranho. Mas deixei quieto. E fomos para a posição constrangedora. Eu tenho vaginismo, de modo que aquela merda de “coleta de material” para o preventivo dói para cacete. E desta vez, doeu de verdade, muito além de qualquer frescura. Eu chorei, fazer o que? Sou molenga para enfrentar dores físicas, acho qualquer topada uma descida ao inferno. Mas eu não poderia ter escolhido expressão mais infeliz para essa minha fragilidade, porque a tática de consolo do doutor foi um desastre. De nada adiantou eu dizer que não foi nada e além do mais já tinha passado! Fora aberto o almanaque de terapia breve quase instantânea do sujeito.
Primeiro veio aquela história de “eu sei o quanto é difícil para você”. Disse que eu tinha tido uma ou duas experiências traumáticas com penetração e depois perguntou se podia “falar abertamente” sobre homossexualidade. Como assim, meu caro? Que tipo de paciente esse sujeito deve estar atendendo ultimamente para formar esta idéia das lésbicas?
Eu disse que não havia problema nenhum em falar sobre o assunto e que tinha achado estranho ele não ter perguntado. “Eu já sabia”, ele disse. Ah, sim, saquei. Seu magnífico livro dos estereótipos não falha na detecção de uma lésbica... Que, como todas as outras, é cheia de problemas com homens, foi abusada pelo vovô na infância e nutre verdadeiro pavor de se assumir para qualquer pessoa.
Falou de um “problema muito comum entre vocês”, que é ser vista como o homem da relação, daí a dificuldade com o lance da penetração. Não, senhor, eu respondi, pra mim não é difícil alternar papéis sexuais, eu gosto das mãos da mulheres e também gosto de penetrá-las, se é que eu posso “falar abertamente” com o senhor. Não sei se vou ganhar alguma notinha de rodapé no grande livro de estereótipos do doutor, já que ele deu por encerrado o assunto. Marcou os exames e pediu para eu voltar dentro de um mês. Deixa estar, até lá eu preparo meu discurso.
Para terminar em grande estilo a comédia de erros, o doutor olhou para os dois traços que tenho no rosto, aqueles dois sulcos que algumas pessoas têm em torno da boca, e disse que poderia tirá-los “em 15 minutos” e que também fazia um tipo de intervenção que diminuía os pequenos lábios, uma coisa bem rápida. Doutor, o Sr. não imagina o quanto é uma pessoa sensível! Um verdadeiro arraso...
Por Castella, em 07/11/07.
NOVO
A mudança chega pouco mansa
Uma onda ronda o desejar
É melhor se acostumar
O descarte é o deleite
nesta reinância
Sem muita pergunta
Nenhum trago de cicuta
O amor sente-se por um triz
É repleto mas também é deserto
Tudo que é estranho está perto
Com outras flores construir novos ramos
Cortar a raiz
Ser visitante de todos os planos
Como se os olhos por inteiro tudo vissem
Estes olhos que nunca padecerão de velhice
Por Zelig, novembro 2007.
Confissões e Táticas de Uma Tabagista Inveterada
Como vive alguém que fuma?!
Uma mulher! Como vive uma mulher que fuma???
Já TEM suas táticas de guerra.
E mesmo quando com isqueiro funcionando.
Mantenha uma caixa de fósforos, bem cheia...
Em cada local estratégico de seu Mundo.
De seus muitos mundos também, e em especial.
Uma Fumante inveterada admite que mesmo sendo
O prazer de fumar contigo, descansando em nuvens de algodão doce
Trocando idéias e alguns mais Imagéticos Inimagináveis.
(Risos)
E dizem que somos loucas.
Mesmo assim, minha doce criança
Prefiro, tu para sempre longe
Desse meu prazer inveterado, qual maldição e parte exótica
De minha confusa pessoa.
Desculpe, Jovem,
Já não somos as únicas
Que encontraram o Amor
Nós somos felizes!!!
Autoria Irresponsável de
Safo, A Poeta
em 19/07/2007 – 21:55
PS: Safo (A Poeta) e a autora do blog safonocinema não são a mesma a pessoa, embora ambas sejam dadas a autorias irresponsáveis.
Documentário sobre a história do cinema gay e lésbico, com depoimentos de vários diretores e atores, que discutem a própria noção de “cinema gay” e o papel dos filmes que abordam esta temática na sociedade. O documentário concentra-se nos filmes produzidos a partir dos anos 70, com base na premissa de que somente desta década em diante os gays passaram a ser representados de modo mais positivo nos filmes. Gays em filmes dos anos 50 e 60 sempre morriam ou eram punidos de alguma forma terrível no final da história. Uma pena que o cinema latino também tenha ficado de fora, sem nenhuma explicação aparente, pois tratam-se de produções que não mereciam ser ignoradas.
Pelos depoimentos, percebe-se o quanto os artistas, com sempre, se sentem desconfortáveis com rótulos, rejeitando a idéia de que existe algum tipo de “queer cinema” ou “cinema gay”. As produções são diversas e todos querem ser reconhecidos pela qualidade de seu trabalho, o que é mais do que justo.
Stephen Frears deu um depoimento-chave no documentário. Disse que ter feito Minha adorável lavanderia, em 1986, nada teve a ver com ser ou não ser gay, mas apenas porque lhe pareceu um ótimo filme, pelo roteiro, pela idéia. Mas notou que o filme afetou muito positivamente as pessoas, quando os jovens vinham lhe agradecer por ter feito um filme em que os gays não pareciam loucos ou neuróticos.
Gus Van Sant, que revelou ter estado envolvido na primeira tentativa de filmar O segredo de Brokeback mountain, sugeriu que parte do sucesso do filme teve relação com o fato de ter um cast careta (atores e diretor), o que facilitou sua aceitação pelo público heterossexual, que assim pôde ir tranqüilo ao cinema ver um filme gay. Bem, parece que nem tudo se resume a talento, então...
A turma do nado sincronizado tem um simbolismo interessante no filme, já que a necessidade de se manter nos padrões parece bem forte para Floriane. Este filme tem um certo paralelo com Nunca fui santa, aquele em que a líder de torcida descobre que é lésbica. Porém em Ninféias a personagem não confronta as barreiras sociais e queima suas fichas tentando se manter sincronizada com as musas hetero do clube.
A atitude de Florianne ao longo de todo o filme é a da clássica ambigüidade sexual. Fica com o bonitão do clube, mas cultiva o quanto pode o amor de Marie, e a seduz sem nenhum pudor, oferecendo-lhe a primeira vez. Marie fica doidinha, totalmente in love e sofrendo até o fim com as oscilações da outra. Seu contraponto no filme é a amiga Anne, que dá certa graça à narrativa com seu desengonço e infantilidade, aliviando a tensão que o relacionamento de Marie e Floriane provoca. Além disso, Anne é heterossexual e, para ela, as coisas também não são muito fáceis, pois está apaixonada pelo menino que anda atrás de Florianne, mas que também corresponde um pouquinho a este interesse.
Floriane também lembra um pouco a Tamsin de Meu amor de verão, que usa a sensualidade para fazer um joguinho meio cruel com Mona. Em ambos os casos, acho que os filmes acabam mostrando que os relacionamentos homossexuais não estão livres deste tipo de relação de poder em que um dos pares domina completamente a cena, fazendo o outro de gato e sapato. De quebra confrontam o mito de que “só uma mulher pode entender a outra”. Ao vermos Mona e Marie mais perdidas do que cego em tiroteio com seus objetos de amor, nos deparamos com um “bem-vinda à raça humana”, a seus prazeres e mesquinharias.
Sweet dreams are made of this, who am I to disagree?
PS: A sessão do Festival, no Estação Barra Point, foi floridíssima...